Resenha: “O pássaro secreto” – Marilia Arnaud

O pássaro secreto traz um desenrolar interessante, pois acompanhamos uma psicopatia infantil crescendo após a narradora-personagem sentir rejeição, solidão e inveja. A Coisa, que ela diz estar dentro dela, vai consumindo-a até chegar em seu ápice de loucura e maldade, sempre machucando a si mesma no processo e mais ainda no final.

Com uma personagem intragável, que gera asco, confusão e distanciamento, o livro deve ser lido e entendido aos poucos, apreciado em cada entrelinha. É uma narrativa com fatos chocantes, mas precisos. Talvez um pouco de estômago seja necessário para lê-lo com cuidado.

“Como amar alguém que vem para dentro do seu mundo sem ser convidado, e ainda lhe rouba tudo, ou quase tudo, considerando o fato de que eu não tinha muito? Como perdoar alguém que lhe rouba até mesmo o que você julgava impossível de lhe ser tirado?”

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Um lado da psicopatia infantil

Aglaia Negromonte é apenas uma menina quando seu pai traz para casa Thalie, a filha fora do casamento. Essa convivência obrigatória, junto com todos gostando de Thalie e dando-a toda a atenção requerida, despertará em Aglaia sentimentos perigosos e maldosos.

Nesse tipo de narrativa, Aglaia se torna a narradora não confiável, afinal o leitor vê tudo pelo olhar da menina, com muito ódio, frieza e inveja. O acolhimento de Thalie traz consigo um abalamento nas estruturas familiares, afetando diretamente a mãe da narradora que precisa cuidar da filha da amante de seu marido e a própria Aglaia que antes tinha uma relação de pai e filha mais intimista, assim como também de neta e avó.

Entretanto, esse choque não pode ser demonstrado por ninguém e a rejeição por parte da família não é uma opção. Isso traz em nossa narradora-personagem um desejo por atenção e as causas geradas por esse abandono e solidão. Aglaia é autodestrutiva e levará todos consigo nesse buraco até ter a atenção que acha apenas ela merecer.

TW: há cenas de transtorno alimentar, estupro e crueldade animal.

“A vida me empurrou para a escuridão ou eu nasci com a escuridão dentro de mim?”

O pássaro secreto é um livro para quem não tem pressa, pois não é uma história para ser devorada

Finalizei essa leitura com sentimentos conflitantes. Ao mesmo tempo em que gostei de várias coisas no enredo, também tiveram outras que me perderam. Acredito que o meu maior problema com o livro foi o fluxo de consciência, isso fez com que eu me perdesse em vários momentos da narrativa, ainda mais porque a escrita é poética e cheia de metáforas. Havia vezes em que eu não sabia do que exatamente ela estava falando ou ainda achava muito enrolada as descrições.

Contrapondo a isso, tinha momentos da leitura que eu me encantava pela escrita e ficava curiosa com a protagonista, com o que ela iria fazer. E esse foi um dos motivos de eu ter ido até o final da leitura: eu precisava saber o que tinha acontecido de tão grave com ela.

De todo modo, é um livro cheio de nuances, então por isso a leitura acaba sendo um pouco mais lenta, mas confesso que eu gostaria de ter gostado mais, pois os temas abordados me interessam bastante. Foi uma leitura que eu já queria fazer, então me sinto satisfeita. Ela também não anula outras futuras leituras da autora que será alguém que ficarei de olho.

Vocês gostam de histórias com fluxos de consciência? 💬

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