Um pouco sobre o conto:
Uma mulher está sentada dentro do ônibus a caminho de sua habitual rotina quando percebe que o homem ao seu lado está segurando um sagui, um bichinho pequeno de estimação. Esse contato com o próximo lhe desperta profundas indagações sobre si mesma e sobre a felicidade ao redor, principalmente aquela que exala do dono do animal perante o pequenino, o amor que um nutre intimamente pelo outro.
É exatamente através da observação do sagui que a personagem reflete sobre alguns pontos essenciais da vida, como o amor e a necessidade de ter alguém próximo para compartilhar o seu dia. Mesmo tendo uma narração em 3º pessoa e colocando como foco o animal, fica claro que as profundezas maiores estão na própria mulher, que aparenta ser solitária e sozinha no mundo.
Em Uma Tarde Plena Clarice Lispector se aprofunda no fluxo de consciência da mulher desconhecida e traz à fundo suas incertezas, arrependimentos e solidão. O conto pode até ser relativamente pequeno em tamanho, contendo apenas três páginas, mas a história consegue se fixar no leitor e se aprofundar em seus pensamentos, permanecendo em sua mente por muito tempo. Arrisco até em dizer que há um pouco da personagem em cada um de nós e, por conseguinte, a identificação com a mesma acaba por ser inevitável e chocante ao mesmo tempo.
“Essa mulher era, aliás, um pouco silenciosa para si mesma e não se entendia muito consigo própria.”
O que extrai da história:
Para mim a leitura do conto foi bem profunda, por mais que eu não consiga explicar exatamente o porque. O meu foco e entendimento principal foram mais centralizados na mulher, que pelo o que entendi não tinha alguém para compartilhar as estranhezas do dia narrado, dando assim a impressão de que era sozinha, sem parentes ou amigos próximos. Talvez a distância fosse o principal motivo para isso, porém nada mais é revelado, restando ao leitor imaginar o rumo da vida daquela personagem e suas lutas pessoais e íntimas.
Mesmo que não seja revelado muito sobre a personagem e nos seja entregue apenas os seus pensamentos mais amplos, a identificação surgiu de maneira fácil e espontânea comigo. Me identifiquei com a personagem por ser calada, até mesmo consigo mesma, e por não conseguir se entender. E foi exatamente isso que ficou comigo após a leitura e que relembro até agora: essa sensação de não ser capaz de entender os próprios sentimentos, pensamentos e a si. E a mensagem da obra ainda vai além mostrando que apesar dessa confusão consigo mesma devemos aproveitar cada detalhe do nosso dia-a-dia e compartilhá-lo com quem mais amamos.
Mesmo que você tenha um interpretação diferente da minha, acredito que a mensagem poderá ser a mesma e a sensação de que alguém, nem que seja apenas um ser humano, te ama ficará grudada na sua cabeça. Ou seja, apesar da perturbação em nossas mentes, das indagações sobre os dias ruins e das revoltas sobre nada estar dando certo, sempre haverá alguém com quem podemos compartilhar tanto nossas incertezas como também as coisas boas da vida. E é exatamente por essas pessoas que devemos lutar e nos manter próximos! Pois mesmo que nós tenhamos dificuldade para nos entender haverá alguém que conseguirá cumprir tal feito com maestria.
Você poderá encontrar o conto Uma Tarde Plena no livro Clarice Lispector – Todos os Contos (compre o exemplar aqui), publicado em 2016 pela editora Rocco.
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A maioria dos contos de Clarice tem esse poder sobre mim, fazem-me sentir muita coisa, mas pouco consigo explicar! Muito bacana sua resenha. 😉
Obrigada!
Acho que o mais sensacional dos textos da Clarice é exatamente essa sensação dúbia e a vontade de querer se aprofundar e entender ainda mais. São leituras maravilhosas!