Literatura

Resenha: “Nós no Subjetivo” – Hellen Cristina

“Por que será que tem algumas pessoas tão intensas? Possivelmente esses pobrezinhos não sabem viver. Primários.”



Lençóis é uma cidade pequena preenchida por um calor insuportável e abafado. Os amigos Ana, Luiz e Diana são únicos a seu modo, cada um com seus próprios problemas pessoais e familiares, mas quando estão juntos conversam sobre a vida, as pessoas, a humanidade, o meio em que somos inseridos e condenados a obedecer.


Os três adolescente tem em torno de 13 anos, mas não se enganem, eles têm pensamentos próprios e ideais fortes. Ana é a mais inflexível. Gosta de estudar sobre assuntos diversos, conhecer religiões diferentes e absorver muito conteúdo para pensar e debater. A menina é intensa, travessa e muito apegada a seus pensamentos, sempre preocupada com as “cordas” que comandam cada ser humano, cada ato supostamente predestinado.


Luiz e Diana, apesar de serem irmãos gêmeos, não poderiam ser ainda mais opostos. O garoto, que é amado por todos que o conhece, extravasa os pensamentos e injúrias através da arte. Pinta para se sentir mais leve e esquecer momentaneamente os problemas pesados que vive dentro do ciclo familiar. Em contraponto, Diana é calada mesmo com os vários pensamentos que a perturbam a mente. Ela guarda tudo para si e confia apenas na escrita, onde expõe o que pensa e cria devaneios que a atormentam. Prefere ficar sozinha, quieta. E mesmo com tantas dificuldades envolvendo a relação dos pais, fecha os olhos e absorve. Vira submissa do carinho superficial. Evita discussões e possíveis modos de soluções.


Nessa história até mesmo o narrador tem opinião. Através de uma narração em 3º pessoa, há um vislumbre do que pensa sobre os personagens e suas ações; o que acha certo ou errado. E por conta disso há partes focadas individualmente em cada um dos personagens, para assim os conhecermos intimamente e adentrarmos com mais profundidade em suas mentes e experiências.


É importante ter a ciência que essa é a uma história sobre cotidiano. Aqui não há surpresas, plot twists ou reviravoltas. Apenas a vida de três adolescentes e as pessoas ao redor. As consequências de seus atos e debates que intercalam entre religião, política e educação. Um fluxo de consciência com teor filosófico e intensidade, características essenciais para os fãs desse estilo textual.

“(…) dizem: o sistema te devora, o sistema te corrompe, o sistema é inabalável, mas a verdade é que nós somos o sistema, nós damos vida, nutrimos e como criadores o possuímos.”

Talvez eu não o tenha lido no momento certo…
Uma leitura agradável, mas que se tornou cansativa e confusa por conta do fluxo de consciência. Eu até gosto de histórias que se utilizam desse meio, tanto que Clarice Lispector é uma das minhas autoras preferidas, porém aqui não consegui entender grande parte dos debates, devaneios e pensamentos, mesmo que soubesse parcialmente qual era o assunto tratado. Talvez esse tenha sido o maior empecilho que tive durante a leitura: não entendê-la. 

Percebi que em certos momentos estava lendo linhas e mais linhas sem compreender grande parte delas, e isso aconteceu com ainda mais frequência mais para o final onde há um texto escrito por Diana, uma das personagens. É compreensível o motivo do texto estar ali e a própria autora diz que pode ser lido dentro da narrativa ou até mesmo após concluir a leitura. Eu segui a narrativa e o li na ordem que estava exposto. Levei três dias para concluir a leitura desse pequeno texto, que pega um pouco mais de 25% da história, e senti que não extrai nada dele. Assim como a própria Ana, que estava o lendo, disse que era um texto confuso, eu também achei.


Por se tratar de adolescentes com uma faixa etária de 13 anos, achei que os debates acabam por se tornar incoerentes, já que um adolescente dessa idade não falaria e nem pensaria de tal maneira, ao menos não a grande maioria. Talvez se os personagens fossem mais velhos, essa parte da consciência teria ficado mais plausível. Aproveitando isso conversei com a autora e ela me explicou que a idade e pensamento dos adolescentes é baseada na teoria das crianças índigo e cristal, um pensamento espiritualista, a qual não conhecia. Não sei se conhecê-la faria diferença na leitura, mas fica a dica de uma possível pesquisa para quem for iniciar a obra. 


Não acho que o livro seja para qualquer leitor, pois para alguns pode resultar em frustração e estranheza. Mas para quem gosta desse estilo de narrativa e dos debates citados, acredito que será uma leitura prazerosa e gratificante, onde extrairá muito conteúdo e assuntos para se pensar/analisar. O texto é profundo e despertará nos leitores uma sensação de desconforto, fazendo-os repensar em sua própria existência e rotina. Uma ótima maneira de despertar novos debates e a vontade perante a aprofundamentos na história do ser humano.


Os personagens são interessantes e os dilemas e dificuldades de cada família se tornam um destaque importante, mesmo que não sejam exatamente o foco. Cada ciclo familiar tem a sua convivência e seus próprios problemas, e saber as consequências das ações dos personagens torna a leitura mais real, crua. Nesse quesito não é uma leitura leve, mas é importante para conhecermos a realidade que se passa dentro de cada casa e entendê-las, principalmente para compreender melhor a vivência e mente dos personagens. 


Mesmo que os protagonistas sejam adolescentes, a identificação é algo que acontece fácil e espontâneo. Eu, por exemplo, consegui me identificar com o jeito reservado de Diana e o acolhimento que a mesma sentia nas palavras. Em vários momentos me vi na personagem, o que fez com que eu gostasse ainda mais dela. Querendo ou não, todos nós já passamos ou iremos passar por situações semelhantes com a dos personagens (ou ao menos com a de algum em específico), sendo uma maneira de relembrar e repensar.


Não sei se a narrativa, por mais que interessante, tenha sido a mais adequada. Vejo a história como sendo perfeita para ser contada por uma narração em 1º pessoa, mas sem garantir se essa ideia agregaria ou não em algo. Talvez essa escolha, ou apenas tenha sido um pouco da escrita, seja responsável por eu ter tido uma leitura lenta e cansativa. Também encontrei erros de revisão e alguns me incomodaram bastante, fazendo com que a leitura decaísse para mim.


Apesar das ressalvas, é um livro que recomendo. Não para todos, mas caso a premissa lhe chame a atenção. Confesso que o li rápido e me arrependi disso, então proponho que o leia calmamente e com cuidado, prestando atenção aos detalhes e minúcias, absorvendo cada palavra. A autora é alguém que quero continuar acompanhando e conhecendo seus trabalhos. Espero também futuramente reler essa obra e extrair tudo que devo.

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