Não é novidade para ninguém que a maioria dos filmes de terror, ou dos gêneros em geral, que chegam até nós são dirigidos – e muitas vezes escritos – por homens. Sem pestanejar, nós os consumimos, os adoramos e os revisitamos sempre que é possível. Mas, também não é nenhuma novidade que existem filmes de terror dirigidos por mulheres que são tão bons quanto os que consumimos na nossa zona de conforto.
Dar atenção ao trabalho das diretoras e roteiristas nos desperta para uma nova percepção do terror: aquele que busca explorar o feminino, seja no corporal, ou nas lutas sociais, ou na visão de mundo, ou nas vivências e sofrências habituais tão comuns entre todas as mulheres. Ao mesmo tempo, encontramos o terror em sua melhor essência, entendemos as motivações das personagens e nos conectamos com mais uma história absurda – às vezes não tanto assim – e tenebrosa.
Por isso, fiz uma singela lista com alguns filmes dirigidos por mulheres, mas nem todos roteirizados por mãos femininas. Separei os meus favoritos, alguns mais conhecidos do que outros, e espero que ao menos um dessa lista tenha a oportunidade de entrar na sua sessão de cinema deste Halloween.
OBS: não posso garantir que todos os filmes sejam livres de gatilhos, então, se houver algum tema que você se sinta desconfortável em assistir, sugiro que pesquise um pouco mais sobre cada um dos filmes.
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Para conhecer o horror brasileiro
Comecemos pela cineasta Juliana Rojas: dela, tenho dois filmes para indicar, Trabalhar Cansa e As Boas Maneiras. Os dois trazem temas parecidos, mas conseguem ir para lados opostos através das diferentes formas de contar suas histórias.
Trabalhar Cansa tem foco em uma família que, com suas últimas finanças, acabou de comprar um mercado para tentar se reerguer. O problema é que no estabelecimento começa a aparecer alguns problemas, como barulhos estranhos a noite, vazamento de água e sumiço de mercadorias (sem contar nuns objetos meio suspeitos). As Boas Maneiras também terá foco em uma família, mas será de mãe e filho, pois a nossa protagonista está grávida e precisa de uma babá para fazê-la companhia nos próximos meses. As duas mulheres começam a criar um laço mais do que profissional, enquanto, ao mesmo tempo, Ana – a grávida – começa a ter momentos de sonambulismo.
Passamos, então, para a diretora Gabriela Amaral Almeida. No momento, só tenho como indicar um, mas pretendo mudar essa situação depois. O Animal Cordial é aquele tipo de filme que começa lento, com você não sabendo pelo o que esperar, mas depois – quando acontece – se torna surpreendente e até mesmo chocante. Tem gore, suspense, tragédias, violência gráfica, luta de classes e preconceito, tudo embalado em uma narrativa que se passa em um ambiente hostil e que está sendo pressionado por pessoas nada bem vindas.
Em seguida, encontramos Mariana Bastos, uma diretora que recém conheci. Assisti à Raquel 1:1 recentemente e a história ainda reverbera na minha mente. Raquel se muda com seu pai para uma cidade pequena, lugar onde o pai nasceu. Após um acontecimento traumático, ela vem se apegando a religião cristã, que é muito presente nessa cidade, mas não de um jeito saudável. O filme irá retratar fanatismo religioso, relacionamento abusivo e o papel da mulher na sociedade, embalados por um teor sobrenatural e angustiante.
Para quem gosta do terror clássico
Para quem gosta do terror mais antigo e clássico, tenho duas recomendações certeiras (ótimas para assistir e reassistir): O Cemitério Maldito e O Psicopata Americano.
Dirigido por Mary Lambert, O Cemitério Maldito, de 1989, é uma das melhores adaptações dos livros do Stephen King. A história potente aborda a questão do luto, de perder entes queridos, e do que seríamos capazes de fazer para tê-los de volta. É claro que sendo uma história escrita por King, não podemos esperar menos do que cenas assustadoras – com maquiagem prática de arrepiar de tão boa -, personagens dúbeis e decisões duvidosas (mas que nós, talvez, faríamos igual).
Um clássico, um pouco mais recente, é O Psicopata Americano, dirigido por Mary Harron. Também sendo uma adaptação literária, o filme traz o ator Christian Bale em um de seus melhores papéis, cheio de individualidade, vaidade e obsessão. As críticas sociais sobre empatia, falta de emoções e beleza, são recheados de muitas matanças e sangue espalhados pela tela. Após assistir esse, também recomendo As Discípulas de Charles Manson, da mesma diretora, esse mais focado nas relações interpessoais entre Manson e suas discípulas e no fanatismo cego das garotas.
Para apreciar novos terrores
Conheci a cineasta polonesa Małgorzata Szumowska meio que por acaso. Assisti a O Rebanho sem saber nada além da sinopse, escolhido no aleatório. Porém, tive uma surpresa enorme ao me deparar com um filme que fala sobre fanatismo religioso e sexismo, de uma maneira que choca e que gera repulsa e ódio. Aqui, conhecemos um culto que vive no meio de uma floresta, isolados, composto por várias mulheres e um único homem. Há toda uma relação de inferioridade perante ao macho supremo da família; inferioridade de ações, de falas, de ser. Selah será quem verá a verdade por trás disso, mas será que uma mulher é suficiente para ir contra a verdade e a dádiva masculina?
Agora, indo para o cinema iraniano, Ana Lily Amirpour se sobressai ao dirigir e atuar em Garota Sombria Caminha pela Noite. Sendo um filme de vampiro que se difere dos demais, Garota Sombria Caminha pela Noite me trouxe uma sensação completamente nova, principalmente por trazer uma nova roupagem para uma criatura já conhecida por todos. Nossa protagonista transforma a sua vida após a morte em uma contínua busca por vingança, respeito e resiliência, em meio a mundo de homens abusivos que merecem sofrer.
Passando para a diretora Natalie Erika James, que é nipo-australiana, temos como indicação o filme Relíquia Macabra. Para quem não sabe, eu tenho um apego muito grande quando os filmes, independentemente do gênero, retratam gerações de mulheres, colocando a filha, a mãe e a avó como centros da narrativa. Relíquia Macabra traz exatamente essa situação e de forma meticulosa, abordando os segredos de tradição entre as mulheres dessa família e a velhice que chega para todas nós. Há certa fragilidade, mas o terror gráfico compensa nas reações controversas.
Não podemos deixar Emerald Fennell, uma roteirista, atriz e diretora, de fora dessa lista. Em 2020, dirigiu Bela Vingança, um filme que acompanha Cassie, uma mulher de 30 anos, em sua busca para vingar todas as mulheres que já sofreram abuso. A trama mistura thriller com drama ao abordar os traumas e a solidão da protagonista junto com seu desejo de fazer certas pessoas pagarem por seus atos. É real, dolorido, mas também satisfatório.
Por último, Karyn Kusama dirigiu Garota Infernal, um filme que me acompanhou bastante na adolescência. Eu guardo um certo carinho por ele, pois foi uma das primeiras produções de terror que consumi – e com protagonistas femininas que me deixaram em êxtase. Encontramos, aqui, possessão, sexualidade, sensualidade e muita força feminina; um filme que indico até hoje e que ainda sinto felicidade em assistir.
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O cenário do horror ainda carece de mulheres, seja protagonizando os filmes, ou dirigindo, ou roteirizando, ou em meios mais técnicos. Temos espaço, mas ainda é pouco. Temos presença, mas ainda não é o bastante. Temos voz, mas não somos ouvidas constantemente.
Até mesmo por essa defasagem, infelizmente nem todas as indicações podem ser encontradas em streaming. Mas garanto que vale a pena deixar cada nome anotado para assistir, se não agora, no futuro. E não apenas os títulos dos filmes, mas também o nome das mulheres que estão por trás. Devemos acompanhá-las, apoiá-las e divulgá-las, pois juntas somos mais fortes e visíveis.
Por conta disso, ainda tenho outros filmes para assistir e indicar. Então, caso gostem desse post, posso fazer uma segunda parte depois, afinal não assistimos filmes de terror apenas no Halloween.
Das indicações, quais foram suas preferidas e quais vocês desejam assistir no Halloween? 💬
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